sexta-feira, 30 de março de 2012

CEC 60 ANOS - ENQUETE


Sócio: Mário Alves Coutinho

1. O que é o CEC?

Começo com o óbvio: existem tantos CECs quanto os sócios que ele teve. O CEC foi programação de filmes, discussão dos mesmos, leituras de livros e revistas, e até mesmo produção de críticas, jornais, revistas, livros e filmes, mas não somente. Portanto, o CEC não foi somente estas produções catalogáveis, mas os sonhos e os desejos de cada um de nós.


2. Fale do CEC que você viveu.

Foram três os momentos em que vivi o CEC mais intensamente:

1963/1968: Quando entrei para o CEC, tinha quinze anos. Estava querendo descobrir não só o que era o cinema, mas o que era a arte, o que era a cultura, e me informar a respeito de quase tudo. Ao mesmo tempo, achava, pelo que corria a boca pequena em BH, que o CEC era um lugar que só podia ser frequentado por pessoas com muita bagagem intelectual, o que não era o meu caso, evidentemente. Arrisquei, e entrei. Só posso dizer que me o CEC atendeu ao meu desejo: abriu minha cabeça não só para o cinema, mas também para a literatura, a música, a pintura, isto é, foi uma abertura para o mundo. Dois anos depois, eu estava fazendo a programação dos filmes de sábado na entidade. Três anos depois, o fechamento; coisas da ditadura militar...

1979/1983 – Com a reabertura do CEC, no Palácio das Artes, por Ricardo Gomes Leite, continuei a frequentá-lo novamente. Neste período, dei uma assessoria para algumas diretorias. Parei de ir ao CEC quando me mudei para a Austrália.

2000/2008: Como o CEC ameaçava fechar as portas, o resultado catastrófico das duas gestões anteriores, algumas pessoas, eu inclusive, resolvemos assumir a entidade novamente. Fui eleito presidente por dois anos. Produzi cerca de seis cursos de cinema, enquanto tivemos no prédio da PUC-Minas, em parceria com a Oficina de Teatro: os professores foram toda a diretoria do CEC, menos Márcia Valadares. Retomamos as programações mensais do CEC no Palácio das Artes. Programei a festa dos cinqüenta anos do CEC: onze longas-metragens, realizados por sócios do CEC, com alguns curtas-metragens idem. Organizei (juntamente com Paulo Augusto Gomes) e editei um livro, para registrar a história, a atuação, e o imenso trabalho teórico e prático, realizado pela entidade. Associados de todas as fases do CEC (dos fundadores, aos que haviam chegado por último) contribuíram com textos para o livro Presença do CEC: 50 anos de cinema em Belo Horizonte.
Fui eleito presidente novamente em 2004, mas renunciei em 2005, pois havia me comprometido com uma bolsa para pesquisar Jean-Luc Godard, em Paris, durante um ano, para escrever minha tese de doutorado em literatura comparada, na UFMG. Quando voltei, em 2006, fui eleito presidente novamente, e aí a atividade do CEC estava mais ligada à realização do Festival Internacional de Curtas-Metragens, que acontecia anualmente. Convidei dois teóricos essenciais para o Festival internacional de curtas, em 2006: Jean Douchet e Alain Bergala, que fizeram apresentações brilhantes. 
   

3. O que era o cinema quando o CEC surgiu? O que é o cinema hoje?

Quando o CEC surgiu, o cinema era a arte das imagens, quase solitária. A televisão era negócio, indústria, o que quiserem, mas não tinha produzido nada de valor, ainda. No entanto, já estava abalando a indústria cinematográfica... Hoje, o cinema, em vez de ter perdido a guerra, como muitos afirmam, para mim, virou o paradigma para a indústria do espetáculo. Atualmente podemos ver filmes nos canais abertos, na televisão de cada um, no computador, no celular, etc. etc. Como disse o profeta Jean-Luc Godard, em 1970: “O cinema morreu; viva o cinema!”


4. Na tua visão, o que mudou na cinefilia, de sessenta anos para cá?

Prosseguindo a resposta anterior: com os filmes disponíveis em todos os lugares possíveis e imagináveis (e agora quase todos os filmes “realmente” existentes podem ser baixados por qualquer pessoa, em casa),  talvez programar filmes em cineclubes não atraia tanto como antes. Mas a discussão sobre o cinema, pelo menos num certo nível de excelência, não é encontrada muito facilmente nestes meios de comunicação. O futuro da cinefilia talvez esteja nos cursos de cinema, e nos debates ao vivo.

5. Quais foram os pontos doutrinários, teóricos e estéticos que você destaca, na trajetória do CEC? Quais os que mais exerceram, sobre você, alguma influência (ou fascinação)?

Resumindo: o CEC, de uma certa maneira, influenciou o cinema que passei a amar e admirar, desde a década de 60: o grande cinema americano (Hawks, Walsh, Ford, Vidor, Fuller, Ray, etc.), a Nouvelle Vague, Bergman, Antonioni, Visconti e, sobretudo, o grande cinema brasileiro, o Cinema Novo (Glauber, Nelson Pereira dos Santos, Joaquim Pedro de Andrade, etc.). O melhor cinema, das décadas posteriores, é herdeiro de tudo isto: Wenders, Jarmusch, Malick, Bertolucci, etc. Além disso, o CEC foi o lugar onde conheci, comecei a ler, fiquei maravilhado, e fiz um pós-doutorado sobre: o grande teórico André Bazin, que traduzi, e sobre o qual pretendo publicar um livro, com a tradução de cerca de quarenta de seus ensaios. Bazin me mostrou simplesmente o que era o cinema. Aliás, ao fazer meu doutorado, dobre Godard, e o pós-doutorado, sobre Bazin, me senti, sempre, como o representante de uma geração, e como o produto da formação de uma entidade: o CEC, exatamente.

6. O que você legou, da tua vivência no CEC, para as atividades profissionais que você exerceu ou exerce?

Tudo que aprendi no CEC, apliquei em tudo que fiz, depois: crítica de cinema, jornalismo, roteiros cinematográficos que escrevi (filmados: Idolatrana, João Rosa, O Horizonte de JK), os livros que publiquei,
inclusive as traduções dos poetas ingleses (William Blake e David Herbert Lawrence) que realizei, doutorado e pós-doutorado, cursos de cinema, etc. No mais, ver minha resposta anterior.

7. Cite alguns personagens com os quais conviveu na tua vivência do CEC.

Já escrevi no livro Presença do CEC: Cinqüenta anos de cinema em Belo Horizonte: a maior influência no meu pensamento, no CEC, foi a de José Haroldo Pereira, muito presente na fase em que comecei a freqüentar a entidade.  Cyro Siqueira, com suas críticas e suas eventuais aparições em debates (como a discussão sobre O Eclipse, em 1964) foi uma presença constante na formação do meu pensamento cinematográfico, assim como Mauricio Gomes Leite, já no Rio, nesta época, mas escrevendo muito sobre o cinema. As discussões com meus amigos, Ricardo Gomes Leite e Tiago Veloso, também fizeram minha cabeça

8. O CEC foi criado sob a inspiração do exercício crítico, a construção de um cinema brasileiro a partir da formação no CEC "traiu" a sua vocação primeira?

A construção de um cinema brasileiro a partir da formação cequiana afirmou a vocação do CEC para o cinema, simplesmente. A passagem da crítica para a realização já havia sido feita pelos italianos e pelos franceses. O CEC simplesmente seguiu esta tendência.


9. Examinando o apanhado de títulos e diretores brasileiros que passaram pelo CEC, ou se aproximaram de diversas formas com ele (CEC), como você vê a possibilidade de existência de um "cinema do CEC"? Existe isto? Ou a constatação é óbvia: a diversidade da produção indicada traduz a multiplicidade de influências que pairavam e cruzavam o CEC, enquanto espaço de vivência do cinema?

Não acredito que exista um cinema do CEC, mas vários cinemas dos muitos CECs de cada um. Ver minha resposta à primeira pergunta.

10. Você acredita numa "mística do CEC"?

Não é que eu acredite, simplesmente acho que ela existe, até hoje, em BH, em Minas, e (talvez) até mesmo no Brasil.

quinta-feira, 29 de março de 2012

UMA PRE HISTÓRIA DO CINEMA MINEIRO CONTEMPORÂNEO

Geraldo Veloso

Tenho falado ultimamente, em diversas instâncias (escritos, correspondência, pessoalmente, em palestras) sobre o que procuro decifrar como um "mistério mineiro". É uma busca edípica, talvez inútil, talvez improdutiva sob o ponto de vista de um resultado claro, cabal, lógico de descrição de um possível "fenômeno". O cinema mineiro sempre existiu, desde que o cinematógrafo aportou ao sul do equador (literalmente, pois Pascoal Segreto filmou a chegada à baia de Guanabara com o primeiro aparelho de tomada de vistas que comprou na Europa, um "Omniógrafo", dos irmãos Lumière). Igino Bonfioli, filmou antes dos anos 10 do século XX e praticou a "mágica" por muito tempo antes que figuras como Paulo Benedetti, Almeida Fleming, Aristides Junqueira, os Masote e, finalmente, o velho mestre, Humberto Mauro (introduzido ao metiê da fotografia, pelo seu sócio, Pedro Comello). Mas houve um grande hiato provocado principalmente pelo advento do filme sonoro. Era muito caro e complicada a operação com o som. Restou a possibilidade do cine jornal, feito com ginásticas curiosas para driblar as dificuldades que o manejo do som apresentava. Figuras como Antônio Bechelleni, José Silva (e, posteriormente, seu fiilho, Sinésio, que trabalharam, ambos, para Juscelino Kubitschek), Nicola Falabella, Celso Araújo e outros, levaram a atividade de imprimir celulose a ter uma presença constante com uma produção de know how e presença de equipamentos, não só de filmagem (com câmeras Eyemo, Bell & Howell e mesmo as primeiras gerações das Arriflex), como de processamento, em "bacias" instaladas no fundo dos seus quintais. Fenômenos como "Caraça, a Porta do Céu", pontuavam episodicamente a cena da produção local (foi um longa metragem isolado em seu contexto). Ou a presença de Luiz Renato Brescia e sua família, criavam um esforço de "fazer à maneira de...", também no fundo de seus respectivos quintais. Projetos como "Centuriões e Rivais" (ou "Nos Tempos de Tibério Cesar", um filme "à maneira" dos filmes romanos de Hollywood, onde centuriões romanos lutavam vestindo relógios de pulso), ou "Sambruck", entre outros, foram heróicos impulsos de replicar a paixão proviciana pelo cinema (não foi assim que Mauro começou: "fazendo como" Henry King, em "Tol'able David", com uma câmera Pathé Baby, de 9,5 mm?). E Brescia fez o seu "tour de force" com "Fobus, o Ministro do Diabo", em meados dos anos 50, do século passado.
A atividade cinematográfica no estado de Minas primou pela atuação de reflexão sobre o cinema. O movimento crítico mundial buscava acompanhar (às vezes influir, induzir) os movimentos de desenvolvimento da "arte menor", o cinema. À reboque da discussão estética (o início do século do cinema foi prenhe de programas estéticos) e de seu derivativo, o debate ideológico, sobretudo determinado pela influência das ideias que se concretizaram na revolução de 1917, na Rússia, o pensamento cinematográfico foi sendo construído, sobretudo na França e na Itália. Mas, no Brasil, o Chaplin Club, radicalizava a polêmica conservadora em torno da recusa do "cinema falado". Enquanto Adhemar Gonzaga, mentor da Cinédia e seu braço jornalístico a "Cinearte", se "rendiam" ao "falado", trazendo as primeiras unidades de sonorização para o país em seus estúdios de Jacarepaguá, no Rio. Mas a discussão no plano intelectual, era polarizada pelas questões trazidas pelo discurso marxista e suas primeiras divergências (sobretudo o trotskismo).
E Minas, de meados dos anos quarenta em diante, busca a sedimentação de um cineclubismo que vai se afirmar na criação do Centro de Estudos Cinematográficos, em 1951, em Belo Horizonte (depois houve o CEC, de Juiz de Fora). E, por consequência, na "Revista de Cinema", em 1954.
Mas a produção se resumia aos "cine jornais" convencionais: inaugurações de obras (JK foi um "tocador de obra" compulsivo - desde a criação da Pampulha, como prefeito da cidade, no início dos anos 40 - e sempre esteve preocupado com o registro cinematográfico dos seus sonhos que se tornavam reais), festas, desfiles de moda, inaugurações de agências de bancos, etc.
Quando, no meio dos anos cinquenta, o cinema brasileiro se desvia de uma vocação do cinema popular, adorado pelo público, representado pela produção de musicais (na onda de paródias de musicais "da Metro") e cria o "cinema sério", da Vera Cruz e seus desdobramentos (Maristela, Multifilmes, Kino, etc.), um movimento, colado ao debate ideológico, acirrado pelo fim do Estado Novo (constituinte de 1946, eleição de representantes comunistas para o Congresso e, posteriormente, cassação do registro do Partido Comunista Brasileiro e sua condenação à clandestinidade) e pela recondução, via voto, de Getúlio Vargas à presidência do país, que traz um projeto nacionalista (a lei 2004 do monopólio estatal da exploração do petróleo, a criação da Petrobrás, o impulso de um projeto revolucionário de infraestrutura, de criação da siderúrgica em Volta Redonda, etc.), há uma radicalização da tentativa de estabelecimento de um cinema socialmente crítico, em busca de uma identidade nacional, num modelo já anunciado na Itália pós fascista, pós guerra, traduzido pelo neorrealismo, induzido pelo avanço do debate estético, do amadurecimento do cinema enquanto linguagem, na sua vocação de tribuna das ideias políticas em causa (o que não era novidade pois os regimes fortes do princípio do século logo se apropriaram da arte "popular" para veicular seus discursos programáticos). E o Brasil não está fora deste contexto. Mauro já anunciava um cinema que "fotografava" o homem brasileiro, em sua simplicidade poética, em sua pureza "primitiva", numa dramaturgia inteiramente moldada por um olhar mimético, mas completamente "abrasileirado", em sua honestidade intocada pela vivência provinciana. Ou pela presença de Orson Welles em seu "maldito" périplo por um Brasil que se envergonhava do que o "gringo" louco buscava registrar. E deu na "maldição" de "It's All True". Ou mesmo nas tentativas, já na Atlântida, de José Carlos Burle e Moacyr Fenelon (num impulso que vai dar na "chanchada") de mostrar e registrar um Brasil popular. E o Estado Novo "compra" a ideia de Roquete Pinto de criar um olhar sobre o país, num projeto nacional de levantamento audiovisual de suas entranhas (o Instituto Nacional do Cinema Educativo, cuja maior "estrela" acabou por ser Humberto Mauro), além do projeto pragmático de criar um cinema "didático", instrumental, educativo - como o seu nome o induzia a ser.
Alberto Cavalcanti, chega à Vera Cruz, ávido por aplicar o seu aprendizado do cinema documental inglês (que, num determinado momento, o obrigou a, em nome da sobreviência, "adiar" o projeto estético - "Filme e Realidade" - para mergulhar nos estúdios da Ealing, de Michael Balcon e de outros produtores ingleses), dos seus primórdios no cinema, em sua fase de gênese ("Rien Que Les Heures", "En Rade") e procura trazer a cultura de um cinema dramaturgicamente articulado, "bem fotografado", numa estrutura industrial que pudesse dar conta das novas exigências de um figurino estético que começava a dominar o universo do cinema, como dissemos, dominado pelas ideias neorrealistas (uma contradição: o neorrealismo não fugiu dos estúdios para aplicar uma metodologia do "cinema pobre", vindo da pobreza de meios, retratando a pobreza de um país destruido?). A Vera Cruz era um poço de conflitos e contradições conceituais, nas quais Cavalcanti se afogou. Mas saiu de lá e propôs um cinema coerente com as suas ideias, logo em seguida. "Simão, O Caolho" e "O Canto do Mar", sobretudo, cofirmaram e deram as direções para obras que logo aconteceram: o episódio brasileiro do filme produzido por Joris Ivens, "Rosa dos Ventos", produzido por Cavalcanti, trouxe à cena um nome (vindo do jornalismo, da crítica e do contexto ideológico), Alex Viany e seu assistente, Nelson Pereira dos Santos. Ali começava uma nova trajetória do cinema brasileiro. Paralelamente, a discussão em torno da busca de uma dramaturgia brasileira ocorria no âmbito do Teatro de Arena, encabeçada por Gianfranceso Guarnieri, Augusto Boal e outros, buscando uma radicalização da dramaturgia proposta pelo Teatro Brasileiro de Comédia (que acabou por influir na formação da estética da Vera Cruz).
A crítica mineira acolhe o debate ideológico e estético, em torno do neorrealismo, através da "Revista de Cinema" e dá cobertura aos primeiros "produtos" do cinema, feitos por Nelson Pereira dos Santos. E aí começa o grande debate interno, dentro do CEC: o cinema, para nós mineiros, é um objeto de reflexão e pensamento. É um ponto de partida, inclusive, para o debate das ideias políticas que fervilhavam e reproduziam os movimentos da história do século (naquele momento: a tomada do poder por Mao Tsé Tung - ou Mao Zé Dong, como querem alguns, hoje - na China, a guerra fria, o macartismo, a descolonização da Argélia, as guerras da Coréia e da Indochina, o aparecimento do conceito de "terceiro mundo", o avanço do existencialismo enquanto influência "pessimista" sobre a visão do mundo à beira do apocalipse nuclear, pós Hiroshima/Nagasaki, os reflexos do XX Congresso do PCUS sobre os movimentos políticos, etc.). Tudo isto era o que pontuava no olhar sobre o cinema, exercido pelo CEC. O cinema não era para ser "realizado", no âmbito do CEC e sim, pensado.
Glauber Rocha esteve em Minas, buscando apoio para um projeto de um "cinema nacional" diferenciado. A Bahia já anunciava um esforço de realização, iniciado pela presença de Trigueirinho Neto ("Bahia de Todos os Santos") e Alex Viany ("Sol Sobre a Lama") que começa a "capitalizar" o grande movimento intelectual da Bahia, em torno do cinema (Walter da Silveira), da poesia (Jogralesca), da literatura (Jorge Amado), da música (Dorival Caymmi num ponto, Koelreuter, em outro), do Teatro (Martim Gonçalves), etc. Mas Minas resiste, pelos seus pensadores de cinema, altamente influentes no contexto da teoria cinematográfica, com repersussões nacionais. Somos "observadores críticos" do cinema. E o fazemos com autoridade reconhecida.
Mas o Cinema Novo cria novos ambientes para a expansão da realização de cinema no país. Novos olhares, novas estratégias de produção, novas gerações de realizadores, novas tecnologias (câmeras leves, silenciosas, equipamentos mais ágeis, películas mais sensíveis, entre outros dados).
Em 1964, logo depois do golpe militar, chegam a Minas, apresentados por Nelson Pereira dos Santos, Joaquim Pedro de Andrade e Roberto Santos, apoiados por Luiz Carlos Barreto, um jornalista (fotógrafo da geração de ouro do jornalismo brasileiro, reunida na revista "O Cruzeiro"),  que começava seus primeiros passos na produção de cinema. Joaquim e Roberto propõem uma colaboração com as gerações de cinéfilos que se formavam na Escola de Cinema da Universidade Católica, sob a orientação do Padre Eidemar Massote e nos bancos do CEC. A filmagem dos longas "O Padre e a Moça" e "A Hora e Vez de Augusto Matraga" anuncia um novo tempo para o cinema mineiro. O CEC rompe a sua vocação de exclusividade de formação de pensamento cinematográfico e fornece colaboradores para as produções realizadas em torno de Diamantina, no Nordeste de Minas.
Na volta das filmagens, os grupos remanescentes das produções, se reunem e fundam o Centro Mineiro de Cinema Experimental, o CEMICE. E aí começa uma nova geração de esforço de produção que, imediatamente, produz uma leva de curtas metragens. Nomes como Carlos Prates Correia, Schubert Magalhães, Flávio Werneck, Márcio Borges, Neville d'Almeida, Luiz Otávio Madureira Horta, José Américo Ribeiro, Hélio Gagliardi, José Tavares de Barros, Jorge Dantas, Milton Gontijo, Luiz Alberto Sartoni, Túlio Marques Lopes Filho, Alberto Graça, entre outros, se apresentam no panorama da realização de cinema. O cinema mineiro anuncia um novo momento de presença no panorama do cinema brasileiro contemporâneo.

Uma geração e seus personagens
Neville d'Almeida, Rogério Sganzerla, Andrea Tonacci, Sylvio Lanna e muitos outros

Acompanhando todo o desenvolvimento do processo cultural cinematográfico da cidade, os nomes de novos personagens surgem neste contexto. Na geração que surge em torno do projeto de José Haroldo Pereira, "Namorados", frustrado pela ocorrência do golpe militar que "sacrificou" alguns "padrinhos" que apoiavam o projeto, alguns colaboradores vão se formando, criando uma turma de pretendentes à realização. Carlos Prates Correia, Schubert Magalhães (que já estava num processo avançado de presença no cinema profissional, na colaboração frustrada com Luis Paulino dos Santos, juntamente com Flávio Pinto Vieira, no projeto de "Barravento", que acabou por ser realizado por Glauber Rocha, além de já ter colaborado com Walter Hugo Khouri, em "A Ilha"), Geraldo Veloso (aquele que vos fala), Guaracy Rodrigues, entre outros.
No elenco formado para o filme, encabeçado pelo pioneiro do teatro mineiro, Jota Dângelo (um dos mentores do grupo Teatro Experimental, com João Marschner, Carlos Kroeber, Jonas Bloch, Ezequiel Neves, entre outros), aparecem várias caras novas que vão pontuar o teatro mineiro à partir de então: Eid Ribeiro, Edmar Pereira, Isaias Almada, Ezequiel Neves, José Aurélio Vieira, Neuza Rocha, Gabriela Rabelo, Dely Fantini e uma figura carismática que já era notória nas rodas sociais da cidade: Neville d'Almeida.
Amigo de Guará, com quem compartilhava um trabalho no Banco da Lavoura, Neville, identificado com Ezequiel Neves e outros da turma de teatro (entre eles Rodrigo Santiago, Roberto Camisassa), era uma figura muito marcante nas rodas sociais da cidade. Neville era irmão de Brasil Winston, um dos atores que se incorporaram à trupe de "Namorados", formado pelo Teatro Universitário, dirigido então pela Haydée Bittencourt. Neville demarcou a sua presença como uma figura caristmática (qualidade que mantém até hoje). Em torno dele estava um grupo que frequentava o jovem "society" de BH. Neville, sempre preocupado com o "lay out" pessoal, apresentava roupas requintadas e originais (minha preocupação adolescente com as roupas tinha em Neville um objeto de fascinação e modelo de guarda roupa - me lembro que Neville tinha óculos com o mesmo desenho dos de Marcelo Mastroiani, no filme do Louis Malle, "Vie Privée"). Via Neville nas festas de fim de semana, juninas (do Minas, do Iate), nas horas dançantes do Automóvel Clube e do Minas Tênis Clube, etc. Até que um dia ficamos mais perto, progressivamente. E nos tornamos grandes amigos. Guará nos aproximava ainda mais.
Neville foi o protagonista da encenação de "Eles Não Usam Black Tie", montada no Teatro do Isabella Hendrix, para o CPC, da UNE, seção Belo Horizonte, juntamente com Dely Fantini. Dely, nossa musa, vinha da primeira turma de modelos e manequins, formada pela Casa Guanabara, juntamente com um monte de lindas mulheres pioneiras (Aparecida Rocha, Una - nossas contemporâneas do Colégio Estadual, amigas de minha prima Sônia Bottrel - entre outras).
Uma curiosa obsessão dos pais de ambos, Neville e Brasil, levou-os a dar nomes para os filhos, de dois chanceleres britânicos (Neville Chemberlain, aquele que declarou a guerra aos alemães, depois da invasão da Polônia e Winston Churchil, que liderou o esforço de resistência inglesa à virtual invasão nazista, do país).
Neville, logo depois que seu irmão decidiu se mudar para Nova Iorque, faz o mesmo. Fica por um ano e meio e volta com o propósito de filmar. Se une ao grupo de amigos do CEMICE e roda seu primeiro flme de curta metragem brasileiro (tinha feito um filme, como exercício de escola, em Nova Iorque), "O Bem Aventurado", estrelado por outro grande amigo comum, Sérgio Lara. E o filme acompanha a primeira "leva" de projetos mineiros que foram apresentados no II Festival do Cinema Amador JB/Mesbla, do Rio de Janeiro, em 1966.
O Festival de Cinema Amador JB/Mesbla é o ponto de revelação fundamental, de uma nova geração de cineastas, num momento de gênese do moderno cinema brasileiro. Suas primeiras versões (ocorridas nos anos 1965, 1966 e 1967, sobretudo) revelaram ou repercutiram uma nova geração de realizadores que passaram a atuar de forma regular a partir de então. Alguns diretamente presentes nos festivais, outros como presenças na famosa "geração Paissandu", que se formava na frequência regular ao cinema "cult" do Rio de Janeiro, na ocasião (em seguida, em São Paulo, surgiu, com o mesmo formato de programação, o Belas Artes, na Av. Consolação, com Paulista - recentemente fechado - e, em Belo Horizonte, os cinemas Pathé, na Savassi e o Cinema Novo, nas vizinhanças do cultuado edifício Maletta). Personagens como Marcinho Borges (parceiro de Milton Nascimento, com o seu filme "Joãozinho e Maria"), Luiz Otávio "Tatá" Madureira Horta ("Ocorrência Policial"). Carlos Prates Correia (o "Pesce Cane") e Flávio Werneck não puderam apresentar os seus "Milagre de Lourdes" e "Interregno", respectivamente, pois já eram caracterizados como "filmes profissionais", realizados por um grupo que já tinha atuação profissional no cinema (inclusive eu, que participei de ambos os filmes, como assistente de direção e montador, respectivamente). A reunião destes filmes a outros que imediatamente se enturmaram, antes e depois do festival, criou uma afinidade criativa que levou a uma ebulição criativa tanto em Minas, quanto no Rio e em São Paulo. Do grupo, faziam parte Maurício Gomes Leite (uma espécie de mentor da turma, pois teve um papel importante como difusor e divulgador, dos trabalhos, na imprensa carioca), que criou a Tekla Filmes, comigo e mais dois sócios (Carlos Heitor Cony e Wilson Cunha), para realizar o seu primeiro filme, o média metragem, "O Velho e o Novo", sobre o seu amigo e mestre, Otto Maria Carpeaux, Rogério Sganzerla (que apresentou seu primeiro curta metragem, "Documentário", no festival JB/Mesbla), Andrea Tonacci (que igualmente trouxe seu primeiro curta, "Olho por Olho", para o mesmo festival), além de Sylvia Ferreira (uma artista plástica mineira, originária do grupo "Claquete", que editava uma revista com o mesmo nome, formado dentro do CEC - que tinha em sua formação Ronaldo Brandão, Antônio Lima, Lúcio Weick, Oswaldo Caldeira, Moisés Kendler, entre outros - e que estava no Rio, cursando a primeira turma da ESDI - Escola Superior de Desenho Industrial) e seu parceiro, Edson Santos, Joel Macedo (que ganhou o primeiro prêmio do II Festival JB/Mesbla, com o filme, "O Quarto Movimento", que revelou a "estrela", Márcia Rodrigues), Haroldo Marinho Barbosa, Sérgio Santeiro (que, marginalizado por ter utilizado atores profissionais em seu filme, "Paixão" - José Wilker e Ari Coslov - acompanhou o processo de formação do grupo), seu irmão Gilberto Santeiro (excelente fotógrafo e depois montador, meu companheiro de geração de montadores), José Carlos Avellar (jornalista do JB, que fotografou nossos filmes da Tekla, o filme "maldito", de Olney São Paulo, "Manhã Cinzenta" e alguns dos concorrentes do festival JB, de Klaus Schell, "A Força do Mar"), José Alberto Lopes e Antônio Calmon, vindos do I Festival do Cinema Amator JB/Mesbla, Sylvio Lanna e Oswaldo Caldeira (que participaram do III Festival). E muitos outros personagens que cuidaram de produzir e projetar uma infinidade de intervenções que sucederam o que ficou definido como Cinema Novo, no país.
Com repercussões em Minas, São Paulo e, sobretudo, no Rio, a ação desses "personagens" criou-se o que melhor se fez como desdobramento do Cinema Novo, no país.
Neville d'Almeida teve um papel muito importante nesse processo e com uma marca pessoal muito definida. O cinema que fez (e faz) teve uma trajetória completamente diferenciada de tudo o que passou a acontecer nesse momento do cinema brasileiro.
Uma infinidade de ações foram sonhadas e realizadas a partir de então. Filmes "de espisódios" foram pensados, para realização reunindo Neville, Rogério, Tonacci, Veloso, Schubert Magalhães, entre outros. Em Minas Moisés Kendler, um cequiano (que me levou para o CEC), egresso do "grupo do Colégio Estadual", buscou associação com um "velho" crítico, Paulo Leite Soares e se associou a Carlos Prates Correia para criar o projeto "Os Marginais". Depois, Paulo Leite abandonou o projeto e o filme foi feito com dinheiro de co-produção, da Columbia Pictures do Brasil (pela interferência do primo de Moisés, Alberto Shatowsky, junto ao lendário Paulo Fuchs), com Moisés e Carlos Prates. Paulo Leite Soares se une ao concunhado, recém chegado de Roma, onde participou do grupo de brasileiros que fez o Centro Sperimentale de Cinematografia, Geraldo Magalhães, que começa a produzir seus trabalhos, filmando um curta metragem sobre Alberto da Veiga Guignard.
Um novo grupo surge em torno de Alberto Graça (montesclarense apresentado a nós, por Carlos Prates Correia): Moacir de Oliveira e Gláucia Camargo, juntos com ele, fundam uma produtora e logo iniciam a experiência de exibição com o cinema "de bolso" (com projeção 16 mm - uma façanha, na época por não haver a cultura da copiagem 16 mm de filmes novos), o Cinema Novo, incorporando novos personagens ao grupo (Milton Gontijo, Ronaldo Brandão, Otto Castro), num espaço que replicava a experiência do cinema criado na praça General Osório, no Rio (o Cine Poeira), por Luiz Fernando Goulart (que acabou por se tornar um teatrinho, onde Leila Diniz, em início de carreira, estrelou a revista, "Tem Banana na Banda", dos áureos tempos da gênese da Banda de Ipanema, de Albino Pinheiro, Jaguar e a turma que veio a criar o "Pasquim", pouco depois).
Tonacci e Joel Macedo se uniram a mim (que, como sócio de Maurício Gomes Leite, começávamos a preparar a produção do primeiro longa metragem de Maurício, "A Vida Provisória"), para a criação da Tempo Produções Cinematográficas Ltda. para dar suporte à realização do projeto de um filme com três histórias, "Os Últimos Heróis". Tonacci, que já vinha realizando uma série de tomadas de um projeto de sua concepção, se incorpora a nós e filma mais uma série de situações, "costuradas" por um monólogo representado por Paulo Gracindo, filmado no Rio de Janeiro, junto com outras sequências (com Irma Alvarez, Nelson Xavier, Marcelo França, entre outros). Joel Macedo, chama Neville d'Almeida para estrelar a sua história, contracenando com uma querida amiga, que já vinha frequentando "a turma", recém revelada por Nelson Pereira dos Santos, em seu "El Justiceiro" (outra "usina" de novos talentos, que Nelson sempre revelava, apresentando para a atividade, figuras como Iberê Cavalcanti - recém chegado de um longo período de vida na Alemanha Oriental e Cuba - Luiz Carlos Lacerda de Freitas, o Bigode, Ivo Campos, Ricardo "Pudim" e a grande estrela - alto astral - Arduino Colassanti, além de Márcia Rodrigues, apresentada por Joel Macedo em seu filme do Fesival JB/Mesbla), Adriana Prieto. Fiz o filme, como produtor executivo (gravei igualmente o som direto do filme do Tonacci, além de montá-lo, depois), e preparei um roteiro meu, um projeto de longa metragem, para se tornar um "média metragem", a ser estrelado por Hugo Carvana, Selma Caronezzi, Joel Barcelos e outros diletos amigos. Aí estaria composto o projeto de "Os Últimos Heróis".
Rogério Sganzerla, na ocasião, anunciava que iria fazer um filme com dez planos sequências, de dez minutos cada (filmado com uma câmera Eclair, NPR), com André Villon (um grande ator de teatro de revista e que havia feito muitas chanchadas, na sua era de ouro) - acho que a ideia, pouco depois, foi aplicada na realização de sua obra prima, "Sem Essa, Aranha!" - e me propunha fazer um filme de "episódios" com Neville, "Impróprio Para Menores de 18 Anos" (é um título e não uma classificação etária).
Criei um argumento sobre uma dupla de personagens que, entre outras intervenções, fazia ações de sabotagem à burocracia (sumiam com fichas de cadastro bancário, jogando-as pela janela do escritório, "davam canos" em operações bancárias, etc.), baseadas em histórias de alguns amigos que praticavam esses pequenos "atos selvagens". Henry Miller pairava como inspiração em sua eterna luta contra a "Cosmodemoníaca". Combinamos dar nomes que ligassem os personagens aos parceiros. Denominei o meu personagem, Almeida (numa referência direta ao Neville). E, mais tarde, o elegi como "imortal" (baseando na história de Simone de Beauvoir, "Todos os Homens São Mortais"). Neville apresentou o argumento que narrava a história de um personagem de vida dupla: era um homem "normal", com trabalho estável, com projetos de enriquecimento, frequentando o "society", em um desempenho social irrepreensível e que, à noite, virava um "bandalho", gigolô, porrista e anarquista. Um esquizofrênico literal que mantinha duas personalidades, como um Dr. Jeckyll e Mr. Hyde.
Mas Rogério logo se uniu ao gerente da Difilm, em São Paulo, o mineiro José Alberto Reis (irmão de vários amigos, como o Dico Wanderley, o homem que respaldou o Cinema Novo em suas relações com o Banco Nacional, o grande sociólogo e politicólogo, Fábio Wanderley Reis, o amigo querido Taquinho Wanderley) e começaram a filmar o "Bandido da Luz Vermelha".
Rogério vinha de São Paulo e se hospedava em minha casa, no Leblon, no Rio (rua João Lyra), enquanto escrevia o seu roteiro do "Bandido". A João Lyra tornou-se um "aparelho". Tinha sido convidado para morar lá por Carlos Freire, um colunista de livros da "Tribuna de Imprensa", que era sócio da livraria que havia no "foyer" do falecido Teatro Santa Rosa, em Ipanema. Freire me foi apresentado pelo Paulo Gil Soares, quando montava o seu filme para a TV Globo, "Amazonas, Mito e Realidade" (uma prévia do que viria a instalar na emissora, um tempo depois, "Globo Repórter". Freire logo me apresentou ao Eduardo Nova Monteiro, que editava uma página semanal sobre cinema, na "Tribuna de Imprensa", sob o comando do Hélio Fernandes (havia o Juri de Cinema do JB, encabeçado pelo Maurício Gomes Leite, com Miriam Alencar, Shatowsky, Alex Viany, Sérgio Augusto, Ely Azeredo, entre outros e, em Belo Horizonte, Ricardo Gomes Leite, Mário Alves Coutinho, Ronaldo de Noronha, Paulo Augusto Gomes, mantinham o mesmo formato editorial no "Estado de Minas") e logo comecei a colaborar, junto com José Carlos Monteiro, José Wolff, Miguel Borges, Geraldo Mayrink, semanalmente.
Quando Neville volta de Nova Iorque, em uma segunda temporada, abrigo-o em nossa casa na rua João Lyra. Neville tinha em sua bagagem, um jogo de refletores Colortran, de quartzo, muitas latas de negativo Kodak, Double-X e um argumento que tinha desenvolvido com o amigo que havia cultivado nessa segunda estadia em NY: Jorge Mautner. Mautner, perambulava entre NY e Londres e estava muito ligado ao poeta contemporâneo, Robert Lowell e já tinha escrito alguns de seus romances/ensaios, "pregando" o cáos, com "k", em suas pioneiras (no Brasil) leituras nietszcheanas. Um menino prodígio com antenas ligadas ao seu tempo. O argumento foi se delineando até se chamar "Jardim de Guerra". Com a ausência de Mautner (que logo chega também e se instala na João Lyra), Neville chama o Guará (que também já estava hospedado na João Lyra, pois sempre que um de nós providenciava um pouso, chamava o outro - foi assim no Edifício Belair, em Botafogo, na rua Anchieta, no Leme, na rua Júlio de Castilhos, em Copacabana e pela vida afora, na Europa) e o João Souza Leite, noivo da Sylvia Ferreira (colegas da ESDI), para desenvolver a ideia do roteiro. E trabalham na João Lyra.
Fazia, na ocasião a montagem do filme do Tonacci e já tínhamos rodado uma parte do filme do Joel Macedo, com fotografia (linda, requintadíssima) do João Carlos Horta. Joel dá uma guinada na vida, depois de algumas experiências lisérgicas e vai para a Índia, Afeganistão, Nepal, etc. E o filme se interrompe. Decidimos, eu e Tonacci, terminar o seu filme, como um média metragem e o filme se torna, "Blá, Blá, Blá". Uma experiência de trabalho fascinante. Uma trilha sonora completamente experimental, barroca mesmo, pontua o depoimento de Gracindo, um ditador anunciando o fim dos seus tempos, numa ego trip política, dentro de um estúdio de TV, prestes a ser invadido, sob inspiração de diálogos de "Primavera Negra", de Henry Miller. Montei, em alguns trechos do filme, nove trilhas sonoras. O gênio da sonorização, Carlos De La Riva, na Rivaton (o laboratório de som mais sofisticado do país, naquele momento, que tinha colaboradores fantásticos como Walter Goulart, Antônio Cesar e outras figuras memoráveis), fazia ginásticas para, em trabalho de pré-mixagens sucessivas, dar conta daquele "tecido" sofisticado de sons sobrepostos (gravei, em São Paulo, trilhas sonoras com músicos - fagotes, oboés, cellos, etc., com um gravador Nagra e depois "combinei" os temas, sobrepondo-os, aleatoriamente, na montagem das trilhas - só tinha, na moviola 16 mm, da Atlântida, onde montamos, uma cabeça de leitura de som!; colocamos o "personagem" do Nelson Xavier "discutindo" consigo mesmo, em superposições de diálogos, também montados aleatoriamente - só vimos o resultado, no processo de mixagem). Só repeti a experiência com tal complexidade e sofisticação experimental, no trabalho de som realizado alguns anos depois, em "Sagrada Família", do Syvlio Lanna (filme "irmão" de outro, do Tonacci, seu primeiro longa, "Bangue, Bangue"), realizado igualmente num processo caótico e super elaborado, com a presença do próprio Sylvio e do José Sette de Barros Filho, nosso querido Zézinho (mas isto é um outro capítulo). Posso dizer que algumas contribuições para o processo de enriquecimento de trilhas ou de experiências sonoras nos filmes da ocasião, foram propostas por mim. A montagem do "O Bem Aventurado" do Neville, já anunciava isso. Confirmei o processo, no trabalho que fiz para Maurício Gomes Leite, em seu "O Velho e o Novo" e em outros filmes posteriores.
Curiosamente, na realização do meu primeiro longa metragem, "Perdidos e Malditos", eliminei a trilha sonora elaborada: trabalhei com o som direto (realizado por Walter Goulart), puro, sem ruídos de efeitos (só editei alguns tiros, no primeiro plano, onde Almeida/Paulo Villaça atira em urubus, em um lixão, do Caju, no Rio, o mesmo lugar usado por Marcos Farias, no seu episódio de "Cinco Vezes Favela", por sua indicação), sem música (o único tema utilizado, ao final do filme, está "sozinho" na trilha: "Miles Runs to Voodoo, Down", do  disco antológico de Miles Davis, "Bitches Brew"). Carlos De La Riva mixou o filme em duas sessões de estúdio. Mal montei o filme, formado por vinte e poucos planos sequências. Só cortei as claquetes e emendei os takes (raramente rodei mais de um take, por plano). O filme teve um processo de montagem de dois períodos de moviola. Na época, não se falava em Dogma 95.
Jorge Mautner chegou dos EUA, pouco depois e também se instalou na João Lyra. Rogério ficava hospedado na João Lyra e escrevia o roteiro do "Bandido". Nos mostrava e pedia sugestões. Escrevia compulsivamente em rascunhos. Anotava frases das pessoas. Uma das famosas frases do Guará, acabou por ser recitada pelo "Luz": "Minha mãe tentou me abortar. Aí eu nasci assim..." (Guará tinha uma conformação física curiosa: seu pescoço era curto e poderoso e falava a frase, divertidamente, para todos nós). E levava o roteiro para Glauber e Cacá Diegues, lerem. E anotava as sugestões. Na ocasião, na porta do Paissandu, apresentei Helena Ignez (minha amiga, mulher de Júlio Bressane, então), para Rogério Sganzerla, que disse: vou convidá-la para fazer o filme. Íamos muito a ensaios de escolas de samba, sobretudo à Mangueira e circulávamos pela noite do Rio (e as praias - a Montenegro era o nosso "point"). Acompanhados de Renata Souza Dantas (que faz figuração no "Bandido"), Lúcia Milanez, Márcia Camargo ("deusas", maravilhosas) e outras figuras. Formávamos um grupo muito cúmplice. Saíamos do Paissandu e íamos para o Lamas, do Largo do Machado, ou para o Cervantes, na rua Prado Júnior, em Copa (na vizinhança do também frequentado, Beco da Fome). E frequentemente víamos o dia nascer, no Leme, na Fiorentina (às vezes na casa da Letícia, também no Leme, em um latifúndio urbano, num prédio na beira da praia).
As passeatas contra a ditadura aconteciam quase todos os dias. Neville e Rogério foram presos, em uma delas e tiveram suas cabeças raspadas, no curto período que ficaram em um quartel da PM, do Rio.
Na João Lyra, realizaram-se as filmagens das cenas de tortura do personagem de "A Vida Provisória": Estevão (Paulo José), era torturado sob a visão da personagem de Márcia Rodrigues, por dois sicários, José Lewgoy e José Wilker (seu primeiro papel de peso, no cinema). Wilker era magrinho e estava se projetando como diretor de teatro. Tinha uma peça de sua autoria em cartaz, no Teatro Jovem, do Kleber Santos, na praia de Botafogo, "Trágico Acidente Destronou Tereza", com uma atriz iniciante, Renata Sorratchewsky, muito bonita e competente, que tinha feito uma "ponta" num filme do Haroldo Marinho Barbosa, apresentado no Festival JB/Mesbla, "Dom Quixote" (que, igualmente, estreou um ator desconhecido, Caetano Veloso). A cena de tortura foi rodada em meu quarto, do apartamento, por toda uma noite, sob protestos da vizinhança que já estava incomodada por aquele movimento insólito de gente maluca naquele aparelho, em pleno processo de recrudescimento da repressão policial da ditadura militar. Renata Sorrah (pouco depois adotou o nome artístico) estreou no cinema profissional, contracenando comigo e com Guará, no "film tract" (à maneira dos que Godard estava fazendo, em maio de 1968, na França) que Maurício Gomes Leite, "enxertou" em seu filme, "A Vida Provisória". Wilker, em seguida, foi convidado por Maurício para estrelar seu próximo longa metragem, "O Jovem Cão" (como Dylan Thomas), que acabou por não acontecer.
A guerra dos seis dias, de Israel contra o Egito, foi pontuada pelo Freire e seus amigos (igualmente, loucos), por execuções de hinos árabes, tocados em alto volume, pela vritrola da casa, com alto-falantes dirigidos para as janelas.
O apartamento era uma festa. Selma Caronezzi, combinada para ser a atriz do meu filme (que acabou por ser novamente "esticado" e tornado um longa metragem que resultou em "Perdidos e Malditos", como acabou por se realizar, anos depois, onde iria cantar e dançar, numa homenagem a Rita Hayworth, como Gilda: "Amado mio..."), também se incorpora à trupe e vai morar conosco. A produção de "Jardim de Guerra" começa e, na impossibilidade de obter armas verdadeiras naquele momento de repressão violenta, Neville manda esculpir fuzis de madeira, pintados, para reproduzir a imagem de fuzis verdadeiros. E o clima político estava pesado. O "aparelho" abrigava reuniões de mobilizações para ações relâmpago de "agit prop" (invadíamos cinemas, gritávamos palavras de ordem contra a ditadura e saíamos correndo, entre outras ações). A festa acabou no final do ano com a decretação do AI-5. Mas aí já haviámos deixado a João Lyra.

Uma trajetória (Jardim de Guerra, Blá Blá Blá, Perdidos e Malditos e outros fatos)

Jorge Mautner faz as mudanças no roteiro e Neville inicia as negociações para criar as condições para a realização do seu primeiro longa metragem. Guará se torna seu assistente e eu, comprometido com trabalhos que me impediam de participar das filmagens, me comprometo a montar o filme. Neville, indicado por Nelson Pereira dos Santos, de quem havia se tornado grande amigo ao ajudar na produção de "Fome de Amor", em Nova Iorque (onde faz uma ponta junto com o irmão Brasil Winston), chama Dib Lutfi para fotografar o filme.
"Jardim de Guerra" é um apanhado de revelações do que viria a ser a revolução que iria estourar, provocada pelos reflexos da reação mundial contra a guerra do Vietnã e que já se anunciava, com os movimentos nas áreas da contracultura (Bob Dylan, o Black Panther Party, Woodstock, a revolução sexual, os Beatles, a expansão do rock, as experiências lisérgicas, o discurso ecológico, a brasilidade e os movimentos de resistência à ditadura brasileira, cada vez mais truculenta e violenta). O filme oscila, em seu discurso traduzido em diálogos programáticos, entre o universo da transgressão (um personagem, Edson/Joel Barcelos, rouba uma jóia de uma mulher morta em um acidente de automóvel, antes de ser "encomendado" a levar uma mala - não se sabe o que há dentro da mala - a troco de uns dólares e, como um bode espiatório, se vê enredado em uma trama kafkiana que define o universo de repressão que o país - e o mundo - vivia, naquele momento) e da poesia atávica (a trilha sonora revela modinhas mineiras, clássicas).
Joel Barcelos, até então uma "ponta" de "Os Fuzis", do Ruy Guerra, é levado a um estrelato completamente identificado com a sua própria biografia pessoal. Um encontro criativo/afetivo se dá entre Joel e Neville. Procurei indicar Wilker para o papel, mas Neville, ao se aproximar de Joel, o escolheu (sabiamente, pelo resultado do filme). Edson tornou-se o nome do personagem, pois na véspera das filmagens, Edson Luis tinha sido executado no restaurante do Calabouço, no Rio, provocando uma série de manifestações que desaguaram na famosa marcha dos "100 mil", que parou o Rio. Maria do Rosário Nascimento Silva, revelada por Carlos Prates Correia em seu "Guilherme" (seu episódio do filme, "Os Marginais", realizado com Moisés Kendler), é chamada para realizar o filme e se torna parte da "turma" de mineiros. O filme cria um desfile de figuras que pontuavam o universo carioca, ipanemense, daquele momento (Paulo Góis, um fotógrafo da turma dos Chopiniques, do Jaguar - onde era o "Motinha" - membro da turma do Zeppelin, do Jangadeiros e da praia da Montenegro, da qual faziam parte Marat, Hugo Bidet e seu ratinho Sigmund, Zequinha Estelita e outros personagens, está no filme). Os amigos Paulo Villaça (que Neville apresenta a Rogério para estrelar o "Bandido") e Ezequiel Neves, formam uma dupla. Guará começa uma longa carreira que constrói, ao longo de uma trajetória bastante particular, um personagem que vai pontuar dezenas de filmes do cinema que muitos chamaram de marginal (mas, no mesmo ano, faz uma ponta em "Macunaima", de Joaquim Pedro de Andrade e contracena comigo e Renata Sorrah, em "A Vida Provisória"). Numa sucessão de aparições especiais, interrogadores/inquisidores se sucedem num processo de "massacre" de Edson/Joel Barcelos: Dina Sfat, Hugo Carvana, Nelson Pereira dos Santos, Emanuel Cavalcanti, Cícero Adolfo Chadler. Antônio Pitanga, em uma festa realizada na casa de nosso amigo comum, Lúcio Weick (um talentoso artista plástico que se tornou um dos maiores profissionais de arte, na área da publicidade, naquele momento e que era casado com a nossa querida Clarisse Lerman, nossa contemporânea do já mencionado e inesquecível Colégio Estadual - que infelizmente nos foi tirada, assassinada em um episódio terrível, em Arraial da Ajuda, há cerca de um ano atrás), para o filme, contracena com vários amigos diletos, desfilando um discurso anti racista, no modo do "Black Panther Party" (que a censura mandou podar do filme, entre outros cortes, que sumiram, com o tempo). Geraldo Mayrink representa o dono da casa, anfitrião de Edson, que namora a nossa também amiga, Vera Brahim (na ocasião, mulher do filósofo e jornalista, Adauto Novaes). Carlos Prates Correia faz uma figuração como guarda de um campo de prisioneiros. Eu, maquiado com uma peruca loura, pela mulher de Jorge Mautner, Ruth, apareci em uma filmagem que, felizmente teve de ser refeita, me poupando de uma melancólica ponta no filme, em uma noite na qual conheci a minha mulher, Betty Autran, mãe dos meus filhos, convidada para a festa/filmagem pela irmã de Chicão, Olga, colega da minha cunhada, Margarida. Chicão, figura importante na trajetória de Neville, teve papel muito grande na produção do filme. Chicão era da "turma de Petrópolis", da qual faziam parte, entre outros, Flávio Moreira da Costa e Paulo Sérgio de Almeida (o querido Paulinho Pé Na Cova, que depois se tornou realizador, "dono" da Filme B, um mago da estatística do cinema brasileiro, depois de dirigir a Rio Filme e, na ocasião, trabalhar na Cinema Novo Promoções, com a Dulce, Marília, Sônia e como free lancer da "Filme Cultura", editada pela Embrafilme). Chicão se aproximou de Neville, em Nova Iorque e se tornaram grandes amigos.
Montei o filme, com o Guará, numa moviola instalada no Museu de Arte Moderna (se não me falha a memória, uma Steenbeck que o Arne Sucksdorf trouxe, anos antes, para a aplicação da sua oficina e que estava sob a guarda do SPHAN), num horário "vampiro" (entrávamos às 10 da noite e trabalhávamos até as 6 da manhã, do outro dia). Fizemos um trabalho artesanal e cuidadoso. Minhas concepções de construção de trilhas foram complementadas pelas sugestões de Guará e Neville. Uma montagem poética e lúdica foi tentada, dando substância às ideias que o filme propunha. Grafismos (godardianos) se alternavam a planos sequências magistralmente registrados pela câmera (na mão) de Dib Lutfi. O filme se tornou um manifesto de uma geração que começava a despontar em busca de uma nova perspectiva de invenção política diante do vazio ideológico que os movimentos nacionais e internacionais nos colocavam (o cinismo do intervencionismo imperialista, a fragmentação ideológica das esquerdas, a morte de Che, o recrudescimento da ditadura no país, as novas perspectivas das lutas contra o racismo na América e na África do Sul, o ácido lisérgico, o cinema "on the road", a explosão da liberação sexual, o tropicalismo, "Terra em Transe", "Bandido", "O Rei da Vela", maio de 1968, etc.). Neville sempre teve uma grande capacidade agregadora de talentos em torno de si. "Jardim de Guerra" potencializou esse seu talento e deu-lhe uma posição de liderança que o colocou, a cada dia mais, num processo de influência não doutrinária e sim existencial, sobre pessoas. Sua capacidade de sedução pessoal o tornou um "guru" low profile, sem que em nenhum momento reivindicasse ou "fabricasse" isso.
Suas relações com Júlio Bressane e Rogério Sganzerla foram, sutilmente, trazendo para as respectivas cinematografias, uma guinada. "Anjo Nasceu" e "Matou a Família e Foi ao Cinema", são um produto nítido da aproximação de Júlio com os "mineiros" (Neville, Guará que o trazem para Tiago Veloso, que começava a despontar como diretor de fotografia nos curtas metragens da Tekla Filmes). Tenho um papel nisso, juntamente com Neville e Guará. Júlio foi se aproximando de Carlos Prates Correia, de Neville e de Guará. Já o conhecia desde os primeiros momentos de minha presença no Rio, da casa de Eduardo Escorel, onde polemizávamos em torno de temas do cinema. Sua relação com Helena Ignez só contribuiu para a nossa amizade, à medida que o trabalho em "O Padre e a Moça", tinha me aproximado de Helena, de quem me tornei um grande amigo (e tenho o orgulho de o ser, até hoje). E Helena fez o filme de Carlos, "Guilherme", logo em seguida (e montei o filme para ele). Neville e Guará se tornam amigos inseparáveis de Júlio (e de Rogério), junto comigo.
Rogério tinha se aproximado de nós, através de Geraldo Mayrink. Comentávamos, ao ler a tradicional coluna de cinema dos sábados, do Suplemento Literário do Estadão (de onde recebíamos a influência de Paulo Emílio Salles Gomes - de quem nos aproximamos, chamando-o para vir a Minas - ou as opiniões de Gustavo Dahl, Jean-Claude Bernardet e Maurice Capovilla, por anos), que havia um novo "personagem" falando coisas completamente diferentes dos colunistas do Estadão (Gervásio Rubem Biáfora e seus seguidores, além dos despachos de cobertura dos festivais europeus, de Novais Teixeira). Defendia o Cinema Novo (hostilizado pelos referidos colunistas habituais, no contexto do cinema paulista - ao contrário de Paulo Emílio e seus discípulos) e praticava um criticismo identificado com o grupo do Mac Mahon, dos "Cahiers du Cinéma" e de outras publicações francesas (Michel Mourlet, Jacques Joli, Michel Mardore, Fereydon Hoveyda, entre outros - porque não, Jean Douchet, um macmahonista "light"?), com preferências por Samuel Fuller, Joseph Losey, Vittorio Cotafavi, Raoul Walsh, Otto Preminger, Fritz Lang, etc. Um dia Mayrink me comunica que tinha convidado Rogério para hospedar-se em sua casa, em Copacabana e me convidava para conhecê-lo, na porta do Cine Paissandu. Nosso encontro foi memorável. Passamos horas inesquecíveis trocando ideias bastante afins. Rogério, em seguida voltou ao Rio para a préestreia de "Pierrot, Le Fou", de Godard e se hospedou comigo, no edifício Belair, onde morava com Guará e o ator José Marinho. E trouxe um amigo: Andrea Tonacci. Andrea fotografava o seu filme "Documentário" e Rogério montava o filme de Tonacci, "Olho Por Olho". Logo voltaram para o Festival JB/Mesbla com os filmes. E eu ia a São Paulo e me hospedava em sua casa, na Rua Heitor Penteado e saíamos (usualmente acompanhados por figuras como Paulo Ramos, Joel Barcelos, Orlando Fassoni) para a noite, no Giggeto, na rua do Triunfo (onde havia as distribuidoras de filmes da Boca do Lixo, além dos bares e das "moças"). Andrea Tonacci veio para o Rio, só e, apresentado por mim a Sylvio Lanna, foi convidado por ele para fotografar seu filme, "Roteiro do Gravador". Andrea se instalou da "república" de Ponte Nova, na Av. Afrânio de Melo Franco, no Leblon, a uns quarteirões da minha casa, na João Lyra. Da "república", participava um grupo de estudantes de Ponte Nova: Marcelo França, Custódio, Adriano (que foi "sumido", no Araguaia, anos depois), Milon (irmão do Sylvio) e o Reinaldo (um comissário de bordo da VARIG, que nos trouxe negativos para as filmagens de "Os Últimos Heróis", dos EUA). Mais tarde incorporou-se ao grupo o Marcelo "Lelé" Werneck.

Março de 2012
(A continuar)